segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Segredos de Amor e Sangue - Francisco Moita Flores [Opinião]

Título: Segredos de Amor e Sangue
Autor: Francisco Moita Flores
Edição/reimpressão: 2014
Páginas: 244
Editor: Casa das Letras
PVP: 16,90€

Sinopse:
Segredos de Amor e Sangue é um regresso do autor à época em que Diogo Alves, o célebre galego que matava no Aqueduto das Águas Livres, era o grande protagonista do crime em Lisboa. Em 1997 escreveu o argumento para o filme A Morte de Diogo Alves que venceu o Grande Prémio de Ficção da RTP. Agora, traz o célebre criminoso de volta como pretexto para reconstruir a Lisboa popular dos anos trinta do século XIX, um tempo em que a cidade se despia dos antigos trajes pré-liberais e dava os primeiros passos no Liberalismo emergente. Marcado pela violência e pela pobreza, este romance é uma história de ternura e de paixão, num tempo agreste, onde a força do Amor e das Letras se impõe à voracidade da guerra e do crime, num país que tinha uma população com noventa porcento de analfabetos.
É um romance com histórias apaixonadas, de amor e morte, de fascínio pela descoberta das palavras escritas em português. Manuel Alcanhões, o narrador, eternamente apaixonado por Isabel, taberneiro em Alfama, testemunha a chegada do Portugal Moderno que vai aprendendo com as lições de um padre miguelista.

A minha opinião: 
Apesar de a história de Diogo Alves não ser desconhecida para mim, li, inclusive, O Assassino do Aqueduto de Anabela Natário no início deste ano, não consegui ficar indiferente a mais um livro de Francisco Moita Flores.

Moita Flores é um mestre a contar a história da História. E fá-lo como ninguém.

Partindo de uma história romanceada de um taberneiro cujo sonho era aprender a ler e a escrever, o autor dá a conhecer ao leitor, de uma forma simples, mas agradável e perceptível, os costumes da época, o nível de iliteracia em meados do século XIX, a época em que viveu Diogo Alves, mais conhecido como O Pancada, aquele que seria o assassino do Aqueduto das Águas Livres, apesar de nunca ter sido condenado pelas mais de 70 mortes que ceifou.

Manuel Alcanhões, português analfabeto como os 90% dos portugueses daquela época, taberneiro, mas com uma visão do mundo muito diferente da dos seus congéneres, é o narrador. Perspicaz, vivido, é na sua taberna que passam os maiores rufiões do reino. Também só eles e pouco mais frequentavam tabernas daquele tipo numa alfama onde despontava o fado e onde fadistas como a Severa eram consideradas escória da sociedade.Apesar de iletrado questionava o método da polícia em fazer os já condenados por todos em reconhecer os crimes que cometeram ou não. Além disso, mostrava-se completamente contra a pena de morte, encarada pela maioria como um espectáculo digno de se ver.

É na sua taberna que viria a conhecer O Pancada, um homem tenebroso, e do qual desconfiava que seria o perpetrador dos maiores crimes da época. Quando ainda a maioria pensava que as vítimas do aqueduto não eram mais do que suicidas, Manuel já sabia que eram vítimas sim de Diogo Alves, que após sacar-lhes todos os bens os atirava do aqueduto. Vinha a matar desde a segunda metade de 1838 até aos primeiros meses de 1840.





Mas seria outro crime, o da Rua das Flores, que viria a condenar O Pancada e toda a sua trupe.O crime do Aqueduto nunca se chegaria a provar...

Manuel de Alcanhões, personagem fictícia, viria a tornar-se numa personagem fulcral para o desenrolar dos acontecimentos, assim o quis Moita Flores. O autor desejou assim criar uma espécie de herói num taberneiro simples, mas com conhecimentos e força de vontade em aprender, que nos foi contando as inquietudes da população no que dizia respeito à guerra civil que se avizinhava, mas também a uma Lisboa de poetas como Almeida Garrett e João de Deus, de políticos proeminentes e com ideias avançadas para a época, assim como um amor enorme pela sua Isabel, a qual tratava como um seu semelhantes, muito pouco usual numa altura em que as mulheres eram tratadas com condição inferior.

Mais um livro de Moita Flores que recomendo.

Muito bom.



Excerto:
"Isto só lá vai com instrução pública. A ignorância é a maior inimiga da nossa vontade." - pag. 19

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