sexta-feira, 11 de junho de 2010

Homossexuais no Estado Novo - São José Almeida [Opinião]

-->
Título: Homossexuais no Estado Novo
Autor: São José Almeida
N.º Págs.: 240
P.V.P.: 16,50€

Homossexuais no Estado Novo é uma primeira tentativa de abordagem ao que foi a realidade dos homossexuais em Portugal durante praticamente todo o século XX, ou seja, desde que a jovem Primeira República, enquadrada pela psiquiatria, coloca sob a alçada da lei os crimes contra a natureza até que estes o deixam de ser, em 1982.
O que era ser homossexual em Portugal?
O que é viver uma condição estigmatizada e estigmatizante, em que não há identidade, tão-só uma afectividade e uma sexualidade, quase sempre clandestinas?

A minha opinião:
Após realizar um trabalho sobre homossexuais no Estado Novo para a revista de domingo do jornal Público publicada no dia 12 de Julho de 2009, São José de Almeida decide continuar o trabalho que resultaria neste livro.
E o tema é bastante pertinente já que, desde o dia 9 de Janeiro deste ano que Portugal deu mais um passo na democracia e liberdade, reconhecendo a possibilidade de duas pessoas do mesmo sexo celebrarem um contrato de casamento.
A jornalista e escritora de Homossexuais no Estado Novo faz uma retrospectiva do que é ser homossexual em Portugal na época da ditadura, mas também na guerra do Ultramar, assim como pós-25 de Abril. Um trabalho de investigação sobre o tema, contendo vários testemunhos de pessoas homossexuais, pessoas que viveram numa época de repressão, assim como dá alguns exemplos de pessoas que tiveram grande repercussão na vida portuguesa. Mas antes mesmo do Estado Novo já havia personalidades portuguesas que eram perseguidas pela sua orientação sexual. Caso dos escritores Judith Teixeira, António Botto e Raul Leal. Aos 26 anos, Botto, de sobrancelhas depiladas, era já uma figura típica de Lisboa. Os livros “Canções” de António Botto; “Decadência” de Judith Teixeira e Sodoma divinizada” de Raul Leal seriam mesmo apreendidos.
Judith Teixeira publicaria ainda mais três livros, mas seria também violentamente caricaturada tanto por alguns jornais como revistas. Depois disso nada mais se saberia dela até à sua morte a 17 de Maio de 1959.
Quanto a António Botto este ainda “sobreviveu” até 1947 em Portugal, mas após ter sido exonerado do seu emprego como escriturário no Arquivo de Identificação de Lisboa em 1942, alegadamente por ter recitado poemas na hora de expediente e de ter dirigido galanteios a um seu colega, acabaria por viajar para o Brasil, para tentar sobreviver. No entanto, viveu muito mal e tentou todos os meios para voltar a Lisboa, mas sem sucesso. Até que morre no Hospital da Beneficência Portuguesa a 16 de Março de 1959m depois de ter sido atropelado. Botto é o primeiro escritor a assumir a homossexualidade.
A ideia nessa altura de que se podia tratar da homossexualidade através da medicina foi adaptada em Portugal por médicos de renome como o Prémio Nobel da Medicina, Egas Moniz que dizia que a melhor cura para a homossexualidade era a hipnose. Por isso mesmo, logo que fosse diagnosticado a “doença” da homossexualidade, as pessoas em causa eram, por vezes, internadas submetendo-se a duros tratamentos como electrochoques.
Um desses casos foi o bailarino Valentim de Barros que viveu quase 50 anos no Hospital Miguel Bombarda.
Porém, não se falava de lésbicas, era como se não existisse, mesmo nos meios homo. Havia discriminação de lésbicas feitas por homossexuais. Não há, por isso, um exemplo oficial de uma lésbica em Portugal durante o Estado Novo, embora Irene Lisboa vivesse com uma mulher chamada Aida; da escritora Alice Moderno e de Virgínia Quaresma a primeira jornalista portuguesa. Há ainda o caso das feministas Olga Moraes Sarmento e Palmira Tito Morais.
Apesar de repressivo, o regime de Salazar sempre viveu rodeado de gays tendo vários Ministros homossexuais. No entanto, a PIDE perseguia os homossexuais e polícias à paisana vigiavam os urninóis públicos para depois apreenderem ou chantagearem, a troco de dinheiro os “prevaricadores”.
Há ainda relatos de homossexuais no Ultramar, muitos deles só se manifestando pela ausência de afectos em países tão distantes de Portugal.
Muitos deles, quando regressavam ao nosso país constituíam uma família, casando e tendo filhos. A questão da homossexualidade era mais aberta nos meios artísticos.
O casal de actores Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro tinham relações homossexuais, o cineasta Leitão de Barros, João Villaret, Pedro Homem de Mello, Ary dos Santos, Vasco Lima Couto, os artistas plásticos Lagoa Henriques e Carlos Amado, Mário Cesariny, António Variações ou Al Berto, são ainda outros casos de homossexualismo em Portugal.
Um livro que li de uma assentada e que recomendo pela sua componente histórica sobretudo do ponto de vista das leis em Portugal e noutros países da Europa em relação à homossexualidade.

Excertos:
“A mais inconcebível dessas amenidades de tendências literárias foi uma festa realizada na parte velha da capital e que ficou conhecida pelo “Baile da Graça””.
“Com o caso do “Baile da Graça” no princípio de Fevereiro de 1923 a imprensa descobria a realidade da literatura de Botto”.
“Ninguém queria ter a sorte de Botto e de Teixeira, o próprio Eugénio de Andrade disse que não queria pagar em vida o que Botto pagou” – António Fernando Casais. O mesmo diz que este quadro de autocensura nas artes “só é quebrado pela geração dos surrealistas e por figuras como Mário Cesariny, Natália Correia”, Ary dos Santos…

2 comentários:

Paula disse...

Um livro bastante interessante, gostei muito da tua opinião. Vou adquirir assim que passar na livraria.
Um abraço e obrigado pela partilha.

Maria Manuel Magalhães disse...

Obrigada Paula. Compra que não te vais arrepender.

WOOK - www.wook.pt